Dizer prelúdios

by André Jesus

Há algum tempo já que não me alimentava de coisas que injectam poderes no cérebro. De vez em quando, mas mesmo muito pouco, lembro-me de quando tudo era muito mais simples e a vontade de me expressar através da escrita era maior. Criei um lugar virtual com uma aparência de manifesto Comunista, mas no entanto escrevi absolutamente pouco. É limitada a minha vontade para este tipo de assuntos da leitura e da escrita. Sei que gosto, mas não o faço, logo não o respiro. Como se precisasse de tempo para me sentir realmente apaixonado por palavras e vírgulas. A chave da evolução encontra sem dúvida o seu equilíbrio na inocência dos êxodos. Ao ponto de se criar e recriar, quando bem se quer, o universo para sempre pela primeira vez. Os dias são sempre novos para os moralistas e para os “carpe diem” proclamados por tesões de mijo que se julgam mestres em consciência moral. A idade é um tónico que conforme envelhece faz ferver muito menos sangue a cada contacto e fotografia trivial da atmosfera que nos rodeia. Aquilo que vejo dói muito menos. Gritos, revoluções e mutações transpiram cada vez menos. Já não respondo a tiros de partida fulminantes como se o amanhã fosse um talvez. A lei dos dias giram em torno da guerra entre o sol e a lua, mas nós somos apenas espectadores de um espectáculo que acaba sempre em empate a cada 12 horas. Uma força tem sempre de prevalecer sobre a outra. A minha imaginação tem sofrido graves acidentes intelectuais. Hoje decidi tomar uma dose de Mozart. É sempre misteriosa a forma como tudo parece rimar neste universo desde que foi reconhecida a ciência das coisas. Parece-me que ele começou com uma sonata número não sei do quê, que foi apresentada nalgum número de opus não sei de quem e que eram todos o mesmo número mas que afinal não. Foi uma hora vertiginosa, a nível matemático. Mozart sim, é a droga. É o épico. A verdadeira iluminação neuronal sem qualquer fonte de luz física. Já tinha saudades dele e não tantas como tenho de mim.